terça-feira, outubro 02, 2007

Zero 2, saquinho nele!

Minha humilde colaboração ao melhor filme do ano brasileiro!

Uma injustiça não terem escolhido ele para representar o cinema brazuca em "roliúdi"...


From Veja

Diários de guerra

Quem são os policiais do Bope, a tropa de elite da PM que enfrenta uma guerra sem fim contra o tráfico nas favelas cariocas.



Manhã no Morro de São Carlos, no Estácio. A equipe do Bope, o Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar, desembarca com a missão de capturar Gilson Ramos da Silva, o "Aritana", chefe do tráfico local e um dos bandidos mais procurados pela polícia carioca. Doze horas depois, já ao entardecer, Aritana aparece no visor do atirador de elite da tropa. O sniper, como é chamado, estava em um ponto estratégico da favela, para dar cobertura aos colegas de equipe, quando identificou o traficante. Aritana carregava um fuzil AK 47 e se preparava para atacar os policiais que subiam o morro. O traficante atirou. No instante seguinte, foi morto com um certeiro tiro de fuzil no peito, disparado a 90 metros de distância pelo sniper. O episódio, ocorrido em março de 2006, foi relatado a Veja Rio pelo próprio atirador (veja foto abaixo), que mantém sua identidade em sigilo por questão de segurança. Pela natureza de seu trabalho, os policiais do Bope evitam aparecer. Eles são os protagonistas da interminável e terrível guerra contra os traficantes na cidade. De um mês para cá, os cenários das batalhas têm sido a Vila Cruzeiro, no bairro da Penha, e as favelas do Complexo do Alemão – um combate que, até terça-feira passada (29), apresentava como saldo dezessete mortos e mais de cinqüenta feridos por balas perdidas e estilhaços de granada.


"Não é fácil tomar a decisão de apertar um gatilho e tirar a vida de alguém", diz o sniper. "Você não sente pela morte de um traficante, mas por saber que ele tem uma família." O dilema, porém, não chega a tirar o sono do atirador. Quem veste o uniforme preto da tropa é treinado para viver na linha de fogo. Sem hesitar. O Bope é a elite da Polícia Militar, com policiais habilitados para resolver situações críticas em zonas urbanas. São 380 homens selecionados com base em dois cursos de admissão. O mais curto, com dois meses de duração, é voltado para ações táticas em casos de resgate de reféns e foi criado após o dramático seqüestro do ônibus 174, em junho de 2000. Na ocasião, a ação do Bope resultou na morte de uma passageira, atingida por um disparo errado de um policial. "Depois do 174, tivemos 39 ocorrências com reféns no Rio. Em todas fomos bem-sucedidos", afirma o capitão Gilmar Tramontini, de 30 anos, responsável pelo Grupo de Resgate e Retomada (GRR) do Bope. Nos Jogos Pan-Americanos, quarenta policiais do GRR trabalharão em conjunto com outros quarenta agentes federais na Unidade Contra Terrorismo.



O outro cartão de acesso ao Bope é bem mais difícil de ser obtido. Em cada dez alunos, apenas dois concluem o curso de operações especiais, voltado para as ações dentro das favelas. O treinamento dura de três a cinco meses e 90% dos desistentes saem nos dez primeiros dias, no período batizado de "Semana do Inferno". "Você desmitifica a experiência de tomar um soco na cara", explica o tenente-coronel Alberto Pinheiro Neto, atual comandante do Bope. "E isso é preciso para testar sua agressividade e seu autocontrole." O tal inferno começa em uma área de treinamento próxima à Represa de Ribeirão das Lages, no município de Barra do Piraí, a 124 quilômetros do Rio. O aluno alterna uma seqüência de exercícios físicos e aulas de luta. Todos os dias, os candidatos correm 15 quilômetros vestidos com o uniforme completo, carregando mochila e fuzil. Em boa parte das atividades do curso, sempre realizado no inverno, o aluno é obrigado a cair na água gelada da represa. Mesmo encharcado e com frio, ele tem de continuar os exercícios. Algumas vezes, o pretendente à vaga no Bope chega a ficar três horas dentro da água. Não são raros os casos de hipotermia – diminuição excessiva da temperatura normal do corpo –, e por isso os treinos têm acompanhamento de médico. "Se o cara passa mal, é atendido na hora, mas assim que os sintomas desaparecem ele volta para a água", conta um ex-aluno. Após um dia inteiro de exercícios puxados, começam as aulas teóricas em sala de aula. Muitas vezes as instruções se estendem madrugada adentro.



O inferno tem trilha sonora. Enquanto fazem os exercícios, os alunos entoam versos tradicionais da tropa: "Homem de preto, qual é sua missão? Entrar pela favela e deixar corpo no chão. Homem de preto, o que é que você faz? Eu faço coisas que assustam o satanás!". No período de treinamento, o candidato dorme duas horas por noite, com comida racionada. As falhas são punidas com rigor. A refeição-padrão é arroz, feijão, carne e massa. Tudo misturado, formando uma pasta. "Se demorar para pegar a comida, ela é jogada no chão. E aí, se quiser comer, tem de ser aquela mesmo", relata outro aluno. Passado o inferno, os sobreviventes enfrentam treinamentos específicos, como cursos de tiro, mergulho e intervenção tática. Na fase final, há o teste de luta, no qual o aluno enfrenta até cinco adversários ao mesmo tempo. "Convidamos lutadores profissionais de vale-tudo e jiu-jítsu para enfrentar os candidatos", diz o comandante Pinheiro Neto. Segundo um ex-participante, alguns alunos saem desfigurados do confronto. Fraturas no nariz são corriqueiras.

Ao fim do curso de Operações Especiais, os sobreviventes recebem o esperado troféu: uma pequena caveira de metal dourado, com uma faca cravada no crânio, o símbolo do Bope. São admitidos com um salário inicial de 1 200 reais. No portão de entrada da sede da corporação, no alto de Laranjeiras, há uma grande placa com a imagem da caveira e um aviso: "Seja bem-vindo, visitante. Mas não faça movimentos bruscos!". No amplo salão de entrada, com vista panorâmica da Zona Sul, outra enorme caveira acaba de ser pintada na parede, sobre um fundo preto. "Ficou bonito, não?", pergunta um policial. Para os moradores das favelas, a chegada do veículo blindado com a tal caveira pintada – o famoso Caveirão – é sinônimo de pânico. Faz cinco anos que o blindado, à prova de tiros de fuzil AK 47, vem sendo usado em incursões nos morros da cidade.

Por onde passa, o Caveirão é bombardeado por granadas e tiros de fuzil. Para o morador, sua aparição significa o início de uma guerra. Não faltam relatos sobre supostos atos de violência do Bope contra a população civil. Do alto-falante que equipa o blindado, dizem os moradores, saem frases ameaçadoras. Na varanda de casa, na favela da Grota, de onde vê quando o veículo se aproxima, dona Marisa (nome fictício) pergunta à neta de 2 anos: "O que o Caveirão diz quando chega?". "Sai da frente, f.d.p.", responde a menina, com olhar assustado. Veja Rio esteve na Vila Cruzeiro e na Grota, no Complexo do Alemão, e conversou com moradores sobre a guerra das últimas semanas. Eles dizem que os policiais estariam atirando nos transformadores da Light durante as incursões, o que deixaria as favelas às escuras. De acordo com o comando do Bope, os tiros são disparados pelos traficantes. Na guerra de versões, os policiais afirmam que a violência do tráfico é minimizada pelos moradores por medo de represálias. "Todo mundo diz que eles estão mais bem armados e têm mais munição do que a polícia. E o tiro em inocentes é sempre o nosso? Seria muita falta de sorte, não?", questiona o soldado Luiz Cláudio Carvalho Ros, de 33 anos, que acaba de ser promovido por bravura.



Ros entrou na linha de fogo para tentar salvar um colega de equipe no segundo dia da operação na Vila Cruzeiro. Eram 9 horas quando a equipe chegou à entrada da favela. O tiroteio começou e o soldado Wilson Santana Lopes, de 28 anos, decidiu atravessar a rua para se abrigar na outra esquina. Foi atingido. Ros pegou o ônibus de transporte da tropa, que não é blindado, e cruzou a rua, sob fogo cerrado. Conseguiu resgatar o companheiro, mas já era tarde. "Toda vez que me deito para dormir, a cena volta", revela. Ros continuou na favela por mais doze horas após resgatar o corpo de Lopes. "É muito difícil manter o controle emocional quando um colega é baleado", reconhece o sargento Daniel da Silva Rocca, da equipe do soldado Lopes. "Só que somos treinados para enfrentar esse tipo de situação", explica. "Nosso ímpeto aumentou muito depois da morte e em minutos tomamos a Vila Cruzeiro. Matar um policial do Bope não é um bom negócio", diz o comandante Pinheiro Neto. O tenente Jaguaribe do Nascimento Ferreira, de 27 anos, define a rotina dos homens de preto: "O Rio não está em guerra. Mas, quando chegamos a uma favela, é vida ou morte".

OS HOMENS DE PRETO
Para ingressar: é preciso ser policial militar há pelo menos dois anos. Antes de ser admitido no curso de treinamento, o candidato passa por teste de condicionamento físico – que precisa ser excelente para a aprovação –, avaliação médica e psicológica.

O treinamento: há dois tipos de curso, voltados para cada uma das divisões do batalhão.

Curso de ações táticas: dura dois meses e é direcionado ao resgate de reféns. Os policiais dessa divisão estão escalados para a unidade contra terrorismo nos Jogos Pan-Americanos.

Curso de operações especiais: de três a cinco meses, prepara o policial para intervenções em áreas de conflito, como situações críticas semelhantes às enfrentadas nas favelas do Complexo do Alemão.

Horário de serviço: turno de 24 horas seguido por 72 horas de folga.

Salário: os soldados ganham 1 200 reais e os tenentes, 2 500 reais (valores líquidos).

O trabalho: há, no mínimo, uma operação por dia em alguma favela da cidade.

Equipamentos: nas operações em favelas, cada policial usa colete à prova de balas, fuzil Fal com oito carregadores de trinta cartuchos, uma pistola .40 e uma faca. Neste mês, o batalhão deve receber seis modelos do fuzil-metralhadora belga FN Minimi, que tem capacidade para dar até 1 000 tiros por minuto. As armas ficarão com a unidade contra o terrorismo durante o Pan e depois serão utilizadas nas operações em favelas.

A música: os versos cantados pelos policiais do Bope durante os exercícios físicos estão em várias versões na internet, em sites como o YouTube. Um dos trechos da letra

Cachorro latindo
Criança chorando
Vagabundo vazando
É o Bope chegando
Tropa de elite, osso duro de roer
Pega um, pega geral, também vai pegar você

O batalhão nas telas de cinema




Até o fim do ano, o Bope deve chegar às telas de cinema. Depois de dirigir em 2002 o documentário Ônibus 174, sobre a malsucedida operação de resgate de reféns feita pela corporação em 2001, o cineasta José Padilha fez agora um filme de ficção. Com um custo de produção estimado em 10,5 milhões de reais, Tropa de Elite tem como protagonista o ator Wagner Moura, no papel de um oficial do Bope. Para cuidar dos efeitos especiais, como tiros e explosões, Padilha chamou o especialista Phil Nelson, coordenador de dublês do filme Falcão Negro em Perigo, de Ridley Scott. "O filme aborda o problema da violência urbana do ponto de vista dos policiais", explica o diretor.

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